Estudioso do Bangu: 'Clube está voltando a se consolidar no Estado'

O que a torcida do Bangu pode esperar do clube em 2013 após passar por muitas emoções no ano anterior? Para obter essa resposta, o SRZD entrevistou o jornalista banguense Carlos Molinari, que é um estudioso da história alvirrubra.

Autor de dois livros sobre o Gigante da Zona Oeste, o pesquisador também analisou as últimas três temporadas disputadas pelo time, lembrou de momentos importantes em décadas passadas, criticou a diretoria atual, falou sobre a rivalidade com o America, o pouco espaço dos clubes de menor investimento na mídia e ainda comentou sobre seu novo projeto.

A estreia do Banguzão no Estadual do Rio está marcada para o próximo dia 19 de janeiro, às 17h, diante do Friburguense, no Estádio Eduardo Guinle. A equipe ainda vai jogar a Copa do Brasil, que terá início em abril. Molinari, inclusive, comemorou a participação da equipe no torneio, mas demonstrou preocupação. Confira tudo que ele disse:

SRZD - O Bangu teve uma arrancada memorável no Carioca do ano passado e depois foi vice-campeão da Copa Rio. No Estadual, inclusive, a equipe foi a única dos clubes de menor investimento a chegar em uma semifinal de turno. Como você avalia a temporada 2012?

Molinari - Pela sua pergunta, qualquer um que lesse, estaria inclinado a dizer que foi uma grande temporada. Mas isso é falso. O Bangu é um clube desorganizado. Não se armou para a Taça Guanabara de 2012, por isso, perdeu 7 jogos seguidos. Teve que se mexer para a Taça Rio, porque senão o rebaixamento era certo. Ou seja, a diretoria teve que gastar um dinheiro que não estava previsto. Essa é a verdade. Tiveram que pagar salários de 20 mil para o Almir, tiveram que contratar - junto com os empresários da Champion Sports - jogadores melhores, como o Thiago Galhardo, o Santiago, o Sérgio Júnior.

O Bangu só se mexeu porque temeu o rebaixamento e, com ele, o fim das cotas da TV Globo. Daí, como precisava fazer muitos pontos no 2º turno, acabou conseguindo a classificação para as semifinais. Caso tivesse feito uns 7 pontos no 1º turno, nada mudaria para o 2º turno. Há males que vem para bem.

Na Copa Rio, o Bangu foi vice-campeão, mas não merecia o título. Nos últimos oito jogos da Copa Rio, o Bangu empatou cinco e perdeu três. Fez uma campanha sempre no limite da eliminação e acabou pagando na final contra o Nova Iguaçu. Na minha opinião, o Bangu jogava sempre pelo empate, acovardado. Tentou levar a decisão para os pênaltis e acabou perdendo. Pelo menos, classificou-se para a Copa do Brasil, o que é muito importante.

SRZD - E para esse ano, qual a sua expectativa?

Molinari - O time que se armou não é ruim. Mantiveram muitos atletas do ano passado, da Copa Rio e, mesmo com problemas financeiros, contratando somente aqueles atletas que não tem passe preso a outro clube, ou aceitando os trazidos pelos empresários ou aqueles cedidos pelo Botafogo, é uma equipe até decente, para brigar entre o quinto e o oitavo lugar no Campeonato Carioca.

Preocupo-me com a Copa do Brasil, que só começará em abril. Caso passe de fase, a segunda rodada só será em maio e aí o Campeonato Carioca já terminou. O Bangu manterá os contratos dos atletas para disputar dois jogos em um mês? E se for até a terceira fase, os confrontos serão em julho apenas.

Torço sempre para o sucesso do Bangu, mas sei o quanto é difícil montar uma equipe realmente competitiva. Craque é caro e raro. Então, vamos a campo com o que podemos.

SRZD - Nos últimos três anos foram dois vices na Copa Rio. Quando não chegou na decisão, o Alvirrubro foi semifinalista. Disputar a Copa do Brasil e voltar ao cenário nacional virou realidade no clube. Pelo que você conhece da história do Banguzão, o time está voltando a ser forte no Estado? E, em competições nacionais, dá para torcida acreditar em resultados expressivos nos próximos anos?

Molinari - O Bangu está voltando a se consolidar dentro do Estado, depois daqueles anos de 2ª divisão. Falta ainda muita coisa, falta ainda ganhar os grandes clubes, falta incomodar mais no Campeonato Carioca, falta ter um projeto ambicioso de participação em campeonatos nacionais, não só a Copa do Brasil. Na Copa do Brasil, é muito difícil. Pode-se ser eliminado em um único jogo.

A torcida é incrível. Eles acreditam sempre, mesmo sem resultados expressivos. Entretanto, em 2013 o Bangu é um clube mais organizado que em 2003, por exemplo.

SRZD - Você fez dois livros sobre o Bangu: "Nós é que somos banguenses" e "Almanaque do Bangu". O primeiro conta toda a história do Alvirrubro. Já o segundo tem as estatísticas dos jogos do clube. Muita pesquisa para um grande trabalho que durou anos. A partir dos seus estudos, como você analisa o Gigante da Zona Oeste nos 108 anos de história do clube? Que momentos não podem ser esquecidos? E quais jamais gostaria de ter lembrado no livro?

Molinari - O Bangu é um clube ligado a lutas sociais, a imigrantes, a operários, isso o faz ter uma história riquíssima nos seus primeiros anos. A época do amadorismo no futebol é, ao meu ver, uma época muito fértil para o clube, para o bairro e para a Fábrica que o criou. Sou fã incondicional dos atletas amadores, daqueles sócios que se inscreviam, conquistavam uma vaga no time, eram ídolos no bairro e ao mesmo tempo, eram operários, vizinhos, amigos dos torcedores do bairro.

O clube foi forte nos anos 30, nos anos 50, 60 e 80. Não há como deixar isso para trás. O Bangu tem tradição, não nasceu ontem, não é um clube de prefeitura, já jogou contra 32 seleções nacionais (entre elas a Espanha, a Holanda, o Brasil, a Argentina), já rodou o mundo, já teve atletas na Seleção, já derrotou os grandes inúmeras vezes, já fez mais de 500 partidas no Maracanã. Não há como comparar o Bangu com os demais co-irmãos que estão na 1ª Divisão do Campeonato Carioca. No máximo com o Olaria e com o Madureira, que também possuem história.

Momentos que não podem ser esquecidos? A contratação de Zizinho, a conquista do título de 66, a alegria que reinou no bairro com o título de 33, a estreia do jovem Domingos da Guia, as vitórias no Maracanã nos anos 50, as fortes contratações dos anos 80.

Não gosto de ter que narrar as roubalheiras do futebol. Você se lembra do que ocorreu em 2002 na semifinal contra o Fluminense. Isso é nojento demais. Não há como vencer, não há como derrubar um grande, os juízes nunca deixam.

SRZD - O America é o principal rival do Bangu? Conta um pouco como começou essa rivalidade.

Molinari - Posso ser realista. Coitado do América. Pra mim, o América foi o principal rival do Bangu, hoje eu não vejo mais espaço para o América na 1ª divisão do Rio. Estamos desde 2004 sem perder para eles. Em 2012, alcançamos a 100ª vitória sobre eles na história. É um clube interessante, disputou seu primeiro jogo diante do próprio Bangu em 1905. Perderam por 6 x 1. A rivalidade começou mesmo nos anos 50. Havia uma luta para saber quem poderia incomodar mais os 4 grandes, quem armava melhores times, quem conseguia pelo menos se intrometer entre eles. Antes dos anos 50 não, Bangu e América ficavam em patamares diferentes, eles eram grandes, nós éramos pequenos. A partir dos anso 50, os dois se tornaram clubes "médios". Mas o América decaiu muito, desde 1987, ao meu ver.


SRZD - Como você avalia a diretoria?

Molinari - A diretoria atual é a mesma desde 1999. Jorge Varela é o presidente, mas nunca pôde dizer que "quem manda aqui sou eu". É parente do presidente da Federação, Rubens Lopes, está ali como os "olhos de Rubens Lopes dentro do clube". Conheci os dois em 1999, Varela tinha 38 anos, se gabava por ser o "presidente mais jovem de um clube no país", mas quem mandava mesmo era o Rubens, que era o presidente do conselho deliberativo.

Varela é advogado, mas não advoga, não trabalha com processos, com tribunais. Sustenta-se com o clube. É complicado isso.

Fora ele, há um sr. chamado Ângelo Marques que também é o presidente, que fica isolado lá na sede social. Ele é que responderia como "presidente" realmente, assina as papeladas. Um dia, se der algum problema fiscal, administrativo, quem responderá judicialmente é ele, nunca o Varela ou o Rubens, que se auto-intitulou presidente honorário, sem o menor amparo dos torcedores do próprio clube.

Mas não queria que eles saíssem hoje não. Deixa o Varela aí, porque se tivéssemos um presidente de oposição no Bangu, a Federação iria prejudicar o time mortalmente.

SRZD - A imprensa no geral praticamente não fala dos times de menor porte financeiro. Você escreve no site que criou (bangu.net) e também aproveita tudo que sai nos outros sites para informar o leitor banguense. A torcida do Bangu comprou a ideia e acompanha sempre? E as torcidas dos outros clubes, conhecem seu trabalho? Como é esse reconhecimento?

Molinari - A imprensa optou por acabar com o Bangu e o América no fim dos anos 80. Qual é a lógica em você pagar 6 correspondentes de clubes? Melhor pagar só 4 repórteres que cubram o dia a dia dos 4 grandes e pronto. O resto vai de notinha. Bangu e América tinham que perder esse privilégio e se afundarem. Foi isso que a grande imprensa fez.

Incrível como a torcida do Bangu acompanha o Bangu.net. Converso com os torcedores sempre que vou aos estádios. Às vezes, nem posso assistir o jogo com calma, porque sempre ficam me perguntando o que eu penso, o que eu sei, o que eu acho. Tem gente que vem me dizer que o primeiro site que acessa diariamente é o Bangu.net. Gostam de ler a notícia do clube, coisa que não encontram em outras mídias. Recebo muitos e-mails durante a semana. Tem gente que me apóia muito, entendem o meu ponto de vista. Tem gente que me detesta e às vezes me mandam e-mails desaforados, mas sem um e-mail verdadeiro que eu possa responder. Os jogadores também se comunicam. O site é leitura obrigatória dos banguenses, concordando ou não com a coluna de segunda-feira.

Os torcedores dos outros clubes conhecem o meu trabalho. Recebo e-mails de outros pesquisadores que ficam encantados com a quantidade de informações que o site tem. O livro "Almanaque do Bangu" também é muito conhecido. Arrisco-me a dizer que é mais comprado por torcedores de outros clubes do que por torcedores banguenses. A pequisa é muito completa. Isso atrai quem também pesquisa sobre futebol.

Contar uma história rápida. Na época que o Bangu não tinha site oficial, eu sei que o próprio Varela - quando era interpelado pela imprensa - dizia assim: "Acessa lá o nosso site, que lá você vai achar".

O "nosso site" era o Bangu.net e nós nunca fomos ligados aos dirigentes, embora eu tenha sido diretor de patrimônio histórico do Bangu entre 1999 e 2001.


SRZD - Tem novos projetos em andamento ou que já estão sendo criados na sua cabeça?

Molinari - Rapaz. Tenho. Você tem visto no site que está saindo todos os domingos o chamado "Livro dos Craques", com pequenas biografias dos atletas que passaram pelo clube desde 1904. Você tem visto também que eu tenho escrito a crônica de um grande jogo do passado por dia. Se hoje é dia 10 de janeiro, eu rememoro uma partida ocorrida nesta data. Assim, terei 365 crônicas históricas. Mas dá um trabalho grande fazer isso. Acho que eu tenho somente 170 dias já escritos, a maioria relativa a jogos dos anos 50 e 60.